Uma Família
Desmantelada
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Considerado um dos livros históricos, porque tem por finalidade a
narrativa dos fatos ocorridos na história de Israel desde a instalação na
Terra Prometida até os dias de Sansão, o antepenúltimo juiz de Israel, o
livro de Juízes tem uma peculiaridade que o singulariza em relação aos
demais livros históricos. Embora seja um livro histórico, em Juízes não há
uma preocupação cronológica, como era de se esperar de uma obra com estes
propósitos, tanto que, após ter narrado o trágico fim de Sansão, o seu
autor passa a contar alguns episódios que não guardam qualquer
correspondência cronológica com o período de Sansão, inclusive nem sequer
se referindo à subida de Eli à função de juiz de Israel, do que ficamos
sabendo somente no primeiro livro de Samuel. Com efeito, a partir do
capítulo 17, o livro de Juízes narra episódios que estão desconectados
cronologicamente da sequência vivida até o capítulo 16 e tudo leva a crer
que os fatos ali narrados se deram no início do período dos juízes, ou
seja, durante o período que havia sido narrado no início do livro.
São episódios que têm, entretanto, um alto significado para o propósito do
autor do livro, que outro não é, como vemos estampado no capítulo 2 desta
obra, que o de revelar a inconstância e a infidelidade de Israel a Deus no
seu cotidiano, a despeito da fidelidade sempre presente e da constância do
seu Deus. O primeiro dos episódios deste final cronologicamente
desconectado do livro dos Juízes é o que nos chama a atenção neste instante
e sobre o qual refletiremos um pouco. Diz o historiador que, na montanha de
Efraim, havia um homem chamado Mica. É este o primeiro personagem a ser
tratado neste capítulo, que se caracterizará por uma narrativa doméstica,
destinada a nos mostrar o estado espiritual das famílias de Israel neste
instante de sua história. De pronto, já vemos que a perspectiva do escritor
sagrado é das mais elogiáveis e das mais avançadas em termos sociológicos,
para nos utilizarmos de uma expressão do nosso tempo. Ao lado das
peripécias e tormentas políticas vividas pelo povo de Israel, que
denunciavam a fragilidade e inconstância espirituais do povo escolhido de
Deus, o escritor sagrado não deixa de também vislumbrar a origem de todo
este estado de coisas, voltando-se para a sociedade e, na sociedade, para a
sua célula-mater, que outra não é senão a família. Todos nós já ouvimos e é
fato notório que a família é à base de toda a sociedade (aliás, nossa
Constituição o diz explicitamente no seu artigo 226), mas, apesar disto,
comportamo-nos como se disso não soubéssemos. Embora seja dito e proclamado
por todos que a família é à base da sociedade, dela não estamos cuidando,
com ela não estamos nos preocupando e, lamentavelmente, tem ela alcançado
níveis mínimos de prioridade na vida de milhões e milhões de seres humanos,
inclusive os que servem a Deus.
O resultado desta postura é a desgraça vivida pelos lares na atualidade,
desgraça esta que tem sido a fonte principal dos principais problemas
existentes no mundo hoje em dia. Deus foi o criador da família, como bem sabemos.
Ao decidir criar a mulher para que o homem não estivesse só (Gn.2:18), Deus atestou, como autor daquela obra-prima,
que era o homem, que este ser era um ser social e, como tal, para que
alcançasse a sua plenitude, deveria viver em grupo, em sociedade, pois só
assim, inclusive, poderia dedicar-se à sua maior tarefa, que era a de
adorar a Deus e demonstrar, ao universo, o Seu grande amor. Sendo, pois,
uma instituição criada por Deus e que serviria de garantia de cumprimento
da finalidade maior do ser humano, certamente a família seria um dos
principais alvos do inimigo do homem, do adversário, cujo trabalho não é
senão matar, roubar e destruir (Jo.10:10).
Por este motivo, desde os primórdios da história humana, buscou desmoronar
as estruturas familiares, pois, derrubada esta verdadeira parede de
proteção criada por Deus para garantia da comunhão do homem com seu
Criador, seu trabalho de destruição e morte fica sobremodo facilitado. Assim,
que, já desde o início, quando da queda do primeiro casal, passou a haver
uma desarmonia e uma desigualdade nas relações familiares, que foram se
ampliando muitíssimo ao longo dos séculos.
A sociedade corrupta e violenta dos dias de Noé tinha como uma de suas
principais causa a desagregação familiar. O próprio Jesus nos diz que,
naqueles dias, as pessoas "casavam-se e dava-se em casamento" (Mt.24:38), numa clara demonstração de que não havia respeito
para com a instituição do matrimônio, como é a vontade de Deus (Cf. Hb.13:4), bem como havia uma liberalização excessiva
dos costumes, a permitir esta triste situação. Aliás, já naquela época, a
começar pela descendência de Caim, havia um total descuido com relação ao
estabelecimento de padrões familiares aceitáveis diante de Deus, tanto que
se adotara a poligamia, como nos dá conta Lameque (Gn.4:19) e da prostituição, pois, segundo a tradição
judaica, este foi o caminho tomado por Naamá (Gn.4:22).Percebe-se, a partir desta civilização
antediluviana, que o primeiro passo para a destruição das grandes
civilizações na história humana, foi a derrocada dos laços familiares, pois
a destruição da família faz com que toda a sociedade, não muito tempo
depois, sucumba de forma irremediável.
Este sucumbir, aliás, não é meramente material, mas, e principalmente,
espiritual, pois privado o homem desta rede de segurança e proteção que é a
família, estará privado de qualquer educação espiritual e, portanto, será
um alvo muito mais fácil dos ardis do adversário, que o levarão,
inexoravelmente, ao mundo da iniquidade e da perdição. A desagregação
familiar é o fator mais poderoso e condição necessária para que se tenha a
derrocada de uma sociedade e a própria desestruturação tanto do indivíduo
quanto do tecido social. próprio Deus, através de Moisés, não deixou de
registrar que o fator que permitiria a continuidade do povo de Israel como
um reino sacerdotal e uma propriedade peculiar de Deus dentre os povos (Cf.Ex.19:5,6) seria a vida familiar, onde seria possível a
transmissão, a todo tempo, dos mandamentos do Senhor (Dt.6:7-9), não tendo a sensibilidade do salmista
deixado escapar que a fonte da destruição seria, exatamente, a falha nesta
transmissão (Sl.78:1-8).
Muitos estudiosos dos problemas sociais veem, com razão, a má distribuição
de renda, as desigualdades sociais, a pobreza, a má qualidade da educação
de grande parte da população, entre outros, como importantes fatores para
as mazelas sociais que vivenciamos, mas a desintegração familiar é, de
todos, o fator mais importante e o que propicia, inclusive, o
desenvolvimento de outros que levam às circunstâncias particularmente
adversas que presenciamos. Este capítulo 17 do livro dos Juízes é uma
verdadeira ilustração do que estamos a dizer. Mica morava na montanha de
Efraim, lugar dos melhores da Terra Prometida, recentemente ocupada pelos
hebreus. Era um local extremamente fortificado, cujos moradores se
notabilizavam pela qualidade de seus carros de guerra (Cf.Js.17:17,18), sendo um lugar de exuberante vegetação,
chamada de bosque, isto em meio a uma terra desértica, como é a Palestina. Era,
também, uma região de clima mais ameno, diante da altitude e que, portanto,
combinava elementos plenamente favoráveis para uma vida material próspera e
agradável. Mas Mica não só morava num lugar próspero, como também era de
uma família próspera, pois é dito que sua mãe havia perdido mil e cem
moedas de prata, uma das maiores quantias mencionadas na Bíblia que
estivessem em poder de uma família comum, como era a família de Mica.
Lembremo-nos de que um bom escravo valia trinta moedas de prata (Ex.21:32) e, portanto, a mãe de Mica perdeu uma quantia
que permitia comprar trinta e oito escravos! Vejam, ainda, que isto foi o
que a mãe de Mica pensou ter perdido, ou seja, a fortuna da família era bem
maior do que isto. Vê-se, portanto, que a família morava num lugar bom e
possuía uma condição econômico-financeira muito boa, mas, nem por isso, era
uma família que pudesse ser tomada como exemplo para o país. Muito pelo
contrário, ela é inserida nas Escrituras Sagradas exatamente para nos
mostrar como uma família pode desencadear um mal eterno e perpétuo para um
povo, mesmo um povo escolhido por Deus, como era Israel, precisamente por
não se estruturar debaixo da Palavra de Deus. A família de Mica será a
ilustração do escritor sagrado do livro dos Juízes de que não basta uma boa
situação econômico-financeira, uma boa posição social, uma boa educação
para que uma família seja bem estruturada e possa contribuir para a
melhoria das condições de vida da sociedade, mas que o fundamento de uma
família deve ser, sempre, a submissão à Palavra de Deus. Pois bem, percebe-se,
de pronto, que, apesar de toda a situação econômico-financeira favorável,
Mica era um ladrão.
Com efeito, as mil e cem moedas de prata que haviam se perdido, na verdade,
diz-nos o texto sagrado (Jz.17:17), haviam
sido furtadas por Mica. Mica era, pois, um ladrão e não poupava sequer a
sua mãe! Para Mica chegar a esta situação, a de ser um ladrão apesar de
toda a sua boa condição econômico-financeira, havia de existir uma razão,
um motivo determinante, pois isto não se dá à toa, sem qualquer motivo ou
razão. Aliás, ensinam os estudiosos do direito penal, que não há crime sem
motivo. O principal motivo de Mica ter se tornado ladrão foi a má performance
de sua mãe no seu papel de educadora. Como podemos demonstrar que a mãe de
Mica falhou na formação espiritual e moral de seu filho? Em primeiro lugar,
vemos que a mãe de Mica, o segundo personagem que surge neste texto que
estamos estudando, era uma mulher que não dava exemplo de serva de Deus. Com
efeito, diz a Bíblia que, quando perdeu as moedas, não cansava de
"deitar maldições" por esta perda (Jz.17:2). Ora, a Palavra nos ensina que a boca fala do
que o coração está cheio (Mc.7:20-23) e,
deste modo, se aquela mãe amaldiçoava incessantemente, a ponto de seu filho
dizer que era o que ouvia de sua mãe constantemente (Jz.17;2), vemos que o coração daquela mulher estava
cheio de maldade e de avareza. Triste é a família em que os pais, que são
os sacerdotes do lar (aliás, a palavra lar é latina e designava,
exatamente, o lugar de adoração na casa, bem como os próprios antepassados
que eram adorados neste culto doméstico, os denominados "deuses lares",
ou seja, é palavra que tinha como significado primeiro o de ser o aspecto
espiritual da família), são os primeiros a ter seus corações cheios de
maldade e de pecado, são os primeiros a indicarem, aos filhos, o caminho
largo e espaçoso da perdição. Aquela mulher, em primeiro lugar, tinha seu
coração cheio de maldade e de pecado, de forma que seu filho somente ouvia
de sua boca maldições. Era isto que aprendia com sua mãe: a amaldiçoar, a
desejar o mal para o próximo, a colocar seus bens materiais acima de todas
as preocupações da vida. Lamentavelmente, este é quadro da esmagadora
maioria das famílias em nossa sociedade, nos dias de hoje. Muitos não têm
qualquer temor de Deus e demonstram isto aos seus filhos que, naturalmente,
tendem a imitá-los e apreender o "modus vivendi" daqueles que são
seus exemplos. Se os pais se conscientizassem quanto representam seus
gestos e atitudes para seus filhos, certamente tomariam muito mais cuidados
no seu cotidiano, no seu dia-a-dia, pois estas ações são captadas pelos filhos,
ainda que de tenra idade (aliás, quanto mais tenra a idade, maior a
captação destes exemplos, pois o juízo crítico estará menos desenvolvido e
a imitação será mais automática), não havendo como, posteriormente,
tentar-se incutir um outro "modus vivendi", pois o exemplo falará
muito mais forte do que qualquer preceito ou ensinamento em contrário,
ensinamento contrário este que ficará desmoralizado e que comprometerá a
autoridade dos pais se não acompanhado do exemplo de vida do ensinador.
A mãe de Mica era uma pessoa costumada a amaldiçoar, a maldizer, a desejar
o mal dos outros, preocupando-se com a vida alheia e nem sequer sabendo o
que se passava na sua própria casa. Outra característica que percebemos na
vida desta mulher é que, além de ter um coração cheio de maldade, era uma
mulher muito preocupada com as coisas materiais e com a vida alheia, mas
totalmente ausente na sua própria casa. Podemos afirmar isto porque a
mulher resolveu amaldiçoar a tudo e a todos pelo desaparecimento de suas
mil e cem moedas de prata, mas não se deu conta de que o ladrão era o seu
próprio filho. Aliás, só o soube por que Mica, cansado de ouvir tantas
maldições, resolveu confessar o crime para a sua mãe.
Isto demonstra que a mãe de Mica estava completamente alheia ao que se
desenvolvia na sua casa e que nem sequer desconfiava de que seu filho era
um ladrão. Um dos graves problemas que a família tem enfrentado nos nossos
dias é, precisamente, a falta de comunicação entre pais e filhos. A vida
corrida dos dias de hoje, a necessidade de a mulher ingressar no mercado de
trabalho e a absorção do tempo restante pelos meios de comunicação (em
especial, a televisão), fazem com que não haja sequer diálogo entre pais e
filhos nos nossos dias, de modo que os pais são verdadeiros estranhos no
acompanhamento do desenvolvimento das crianças e adolescentes. Esta dura
realidade faz com que tenhamos muitas mães de Mica, pessoas que têm suas
atenções voltadas para tantas e tantas coisas no dia-a-dia de nossa vida
agitada, mas que não têm tempo para sequer travar uma conversa ou fazer uma
brincadeira com seus filhos. O resultado é que os filhos se sentem sós e
carentes de afeição e de carinho, não sentem o amor, a companhia que, como
já dissemos supra, é essencial para o ser humano, que foi feito não para se
sentir só, mas para ter companhia, não só a divina, mas também a do
semelhante.
Este vazio que começa a ser criado é uma brecha gigantesca que se abre ao
inimigo das nossas almas e que será preenchido pela idolatria incentivada e
estimulada pelos meios de comunicação e pela indústria do entretenimento;
pelo consumismo desenfreado, em que a carência e a própria omissão dos pais
busca ser compensada pela posse de bens materiais e pelas mensagens
satanistas de erotização (o despertamento precoce do desejo sexual, onde se
buscará a afeição perdida), de banalização da violência e de disseminação
das drogas. Urge que os pais, notadamente os que são servos de Deus,
acordem, o quanto antes, para esta triste realidade, que tem sido um fator
preponderante para a destruição das famílias e, por conseguinte, da nossa
sociedade, de que a família é a principal célula.
A Bíblia ordena aos pais que instruam seus filhos, que os ensinem no
caminho que devam andar, que sejam seus companheiros e amigos. Não é por
outro motivo que Deus Se identifica como Pai no Seu relacionamento com os
homens. Por que Deus Se identifica como Pai? Porque é um ser que pretende
estar sempre ao lado do homem, em comunhão com ele, na sua companhia para
sempre. É este o propósito de Deus para o homem (Ap.21:3) e por isso Se identifica como Pai (ou como
mãe, como se vê em Is.49:15). Cabe,
então, aqui, uma incômoda questão para cada um dos pais que acompanha esta
meditação? Temos sido um pai na acepção bíblica do termo ou temos nos comportado
como a "mãe" de Mica? Mica havia crescido num ambiente avesso à
realidade da Palavra de Deus. Sua mãe, ao invés de edificar a casa e de
dirigir seus filhos no caminho da retidão, tinha seu coração cheio de
maldade e de avareza, de forma que seu filho acabou apreendendo este
péssimo exemplo e se enveredou pelo caminho da cobiça material, diríamos
hoje, do consumismo desenfreado, passando a desprezar os mais elementares princípios
morais, a ponto de furtar a sua própria mãe. Porém, cansado das imprecações
e das "pragas" irrogadas por sua mãe, acabou confessando o delito
e devolvendo as mil e cem moedas de prata para sua mãe. E aí vemos outra
característica lamentável desta senhora, qual seja, diante da constatação
nua e crua de que seu filho era um ladrão, a mãe de Mica nem sequer
repreendeu seu filho, mas, bem ao contrário, diz-nos o texto sagrado, quis
devolver o dinheiro ao filho (Jz.17:3).
Vemos aqui a que ponto chega alguém destituído de qualquer autoridade moral
como era a mãe de Mica. Diante da confissão do delito por parte de seu
filho, a mãe não só não o disciplinou como ainda ratificou o gesto errôneo
de seu filho, decidindo devolver o dinheiro a ele. Um dos graves erros a
que temos assistido nos últimos dias é, precisamente, a falta de disciplina
nos lares, erro, aliás, que, perigosamente, já está se espraiando dentro
das igrejas locais, como, de resto, em toda a sociedade.
A disciplina, ou seja, a correção dos erros exige, em primeiro lugar, que
se tenha um disciplinador, ou seja, alguém que tenha autoridade tal que
seja capaz de corrigir o próximo. A autoridade não vem apenas da posição ou
da convenção de um determinado grupo social, mas exige, sobretudo, o que os
cientistas sociais denominam de legitimidade, ou seja, do consentimento do
grupo, do reconhecimento do grupo de que aquela pessoa está autorizada a utilizar
o poder que decorre de sua posição. A legitimidade advém de uma prática que
sustenta a posição ocupada, de uma vida exemplar, de atitudes que confirmem
a investidura ocorrida em uma determinada posição. É a legitimidade que dá
força e autenticidade ao exercício do poder de quem ocupa um determinado
lugar. Foi a legitimidade que causou a admiração da multidão ao término do
sermão do monte (Mt.7:28,29),
porque Jesus, ao contrário dos escribas e dos fariseus (Cf.Mt.23:2-4), vivia aquilo que ensinava, demonstrava com
sua própria vivência a excelência da Palavra de Deus.
Reside aqui a grande dificuldade em se falar em disciplina nos dias de
hoje, porquanto, cada vez mais, faltam entre os ocupantes das funções
disciplinadoras, quem tenha legitimidade, quem tenha autoridade para
disciplinar.
Não se está aqui, como alguns, querendo justificar a falta de disciplina
pelo episódio da mulher adúltera, onde Jesus impediu a execução exatamente
porque não havia ali quem não tivesse pecado, a não ser o próprio Jesus.
Ali se tratava de uma condenação à morte e esta, mesmo, é algo que está
além da capacidade humana, mas de disciplina, ou seja, de correção. Sim, a
disciplina, ao contrário do que muitos têm entendido, não é uma ação senão
de correção, não tem outro objetivo senão a restauração do errado. Trata-se
de medida que tem como propósito apontar o erro mas com o objetivo de que o
seu autor não volte mais a errar.
Entretanto, quase não mais existem aqueles que têm legitimidade para
corrigir, pois, para que possamos corrigir, devemos dar o exemplo e são
raros aqueles que podem fazê-lo. É na tolerância com as mínimas coisas
erradas que praticamos e consentimos que seja praticado que solapamos a
nossa legitimidade, a nossa autoridade e, por isso, não temos mais
condições de disciplinar o próximo, notadamente aqueles que são colocados
sob nossa responsabilidade (os filhos, os membros da igreja local sob nossa
responsabilidade etc.), o que gera o atual estado de desordem e de
destruição do tecido social dos nossos dias.
A mãe de Mica não tinha como disciplinar seu filho, que se revelara tão
avarento quanto à mãe. A mãe de Mica não tinha como dar um conselho ao seu
filho, de dizer que queria o seu bem, já que tanto o amaldiçoara. A mãe de
Mica não tinha como dizer que sempre se preocupara com seu filho, já que
nem sequer percebera que tinha sido ele o ladrão. Em suma: a mãe de Mica
não tinha qualquer autoridade e, portanto, não havia naquele lar espaço
para qualquer disciplina.
Sem disciplina, não se tem a plenitude do amor na família. Sem disciplina,
não se sente a filiação. Sem disciplina, a destruição e a morte são certas.
Dirão alguns que a disciplina não resolve, pois os índices de violência
doméstica estão aí a demonstrar que a busca da disciplina só gera revolta,
trauma e que é mister um diálogo, uma convivência "de igual para
igual" entre pais e filhos, uma real "democracia familiar". Entretanto,
este ensinamento, baseado no adversário de nossas almas, é completamente
errôneo e antibíblico. Quando se está a falar de disciplina, como já
dissemos, estamos falando, antes de tudo, em autoridade legítima. Alguns,
por não terem legitimidade, partem para a violência, para a força bruta,
sendo tão errôneos quanto os que nada fazem, como a mãe de Mica. Não é o
castigo, não é a violência que resolvem o problema, mas a legitimidade é
ela quem confere autoridade. Destarte, a violência doméstica é também fruto
da falta de autoridade, sendo tão somente a outra reação da autoridade
ilegítima, mas o erro é o mesmo. Dentro das igrejas locais, aliás, temos
também observado estes dois extremos lamentáveis no tratamento dos erros
cometidos pelos irmãos. Ou se estabelece a permissividade ampla, com a
total mistura dos membros com a iniquidade, ou, então, parte-se para a ignorância
crassa, com o uso de mecanismos de violência, inclusive a humilhação e o
desrespeito. Por que isto ocorre? Porque falta, hoje, legitimidade a muitos
líderes, líderes que estão comprometidos com tudo, menos com Deus e com Sua
Palavra. Que Deus nos guarde destas mães de Mica que estão, indevidamente,
ocupando púlpitos e cargos nas igrejas locais!
Pois bem, a mãe de Mica não tinha qualquer condição de disciplinar seu
filho e, por isso, acabou querendo compensar esta falta de autoridade e de
amor com a entrega das mil e cem moedas de prata. Que incoerência!
Amaldiçoou tanto pela perda da sua "fortuna" e agora resolve
dá-las todas para o filho, o próprio ladrão! Mais um péssimo exemplo, mais
uma demonstração de falta de autoridade!
Mica, que não podia ser senão desobediente, simplesmente não aceitou a
"compensação" de sua mãe, que, então, ficou com as moedas mas
perdeu, ainda mais, a sua autoridade. Não ajamos como a mãe de Mica,
procurando compensar com dinheiro, com bens, com qualquer outra coisa, o amor
que devemos dar a nossos filhos. Não há o que compre na terra o nosso amor
para com os pais e, portanto, devemos, sempre, cumprir com o papel que a
Bíblia reserva aos pais: amemos nossos filhos e, neste amor, ousemos
discipliná-los, quando preciso.
Mas temos, ainda, ainda um triste defeito da mãe de Mica: a vida dupla.
Recusada à doação por Mica, sua mãe revela outra faceta de sua
personalidade corrompida. Diz-nos o texto sagrado que a mãe resolveu
dedicar integralmente as moedas para o Senhor e, assim, mandou que um
ourives fizesse uma imagem de escultura e fundição (Jz.17:4) . Esta afirmação da mãe de Mica bem demonstra
que aquela mulher, como tantas outras nos seus dias (e nos nossos dias),
tinha uma vida dupla diante de Deus. Falou em dedicação integral ao Senhor
das moedas, mas usa apenas duzentas delas (eram mil e cem, lembram-se?) e
para que? Para a elaboração de um ídolo, de uma imagem de escultura e
fundição! Evidentemente, quando vemos uma afirmação desta natureza,
observamos como se tratava de um rotundo absurdo, pois aquele gesto
contrariava totalmente o segundo mandamento do Decálogo, que era,
exatamente, o de não se ter imagens de escultura representativas de
qualquer ser ou objeto existente nos céus e na terra (Ex.20:4-6).
Entretanto, para o "modus vivendi" daquela mulher, era algo
extremamente natural, visto até como uma forma de se agradar a Deus,
tamanha era a sua cegueira espiritual. Como é triste quando nos desviamos
da presença de Deus e passamos a querer servi-lo segundo o nosso parecer e
segundo os nossos conceitos. Rapidamente, afrontamos os mais elementares
princípios divinos, precisamente porque O deixamos e passamos a satisfazer
a nossa vontade.
A mãe de Mica pensou estar fazendo uma dedicação integral a Deus quando
ofereceu apenas parte da quantia e, ainda por cima, para a elaboração de
uma imagem de escultura e fundição. Muitos, nos nossos dias, têm o mesmo
procedimento. Dizem estar integralmente dedicados a Deus, mas mantêm parte
de sua vida longe do senhorio de Cristo. Dizem ser integralmente dedicados
a Deus, mas ousam selecionar o que devem, ou não, seguir, das Escrituras.
Dizem ser integralmente dedicados a Deus, mas querem fazer o que desejam, quando
desejam e como desejam. São estes, assim como a mãe de Mica, nada mais,
nada menos que idólatras! Podem até não ter mandado fazer uma imagem de
escultura e fundição, mas por que não o mandaram fazer? Exatamente, porque
já o fizeram, eles mesmos, em seus corações. E quem são estes ídolos? Eles
próprios. O famoso "EU”, que se constitui no maior adversário de nós
mesmos, tanto que o autor de conhecido cântico da Harpa Cristã diz que
temos de vencer a nós mesmos nesta batalha contra o mal. A "dedicação
integral" da mãe de Mica, na realidade, é dedicação nenhuma. Quantos
daquelas mil e cem moedas de prata foram dedicados ao Senhor? Nenhuma!
Portanto, a chamada "dedicação integral" não existia senão na auto
justificação e na religiosidade vazia e hipócrita daquela mulher.
Sem um coração voltado para Deus, sem disciplina, sem amor, aquele lar não
poderia senão ser um lugar de idolatria, senão um lugar dedicado aos ídolos
e ao culto de falsos deuses. Percebemos que aquele lar não se tornou um
centro de idolatria quando o ourives entregou a encomenda para a mãe de
Mica, mas já bem antes disto, havia ali se dedicado aquele lugar para o
culto a falsos deuses.
Bem antes da entrega da imagem de escultura e fundição, já se tinha o
dinheiro como deus desta casa, como se percebeu, como já dissemos, pela
própria conduta daquela mulher ao perder aquela quantia, como pela própria
ganância e cobiça de Mica que o levaram ao furto daquelas mil e cem moedas
de prata.
Bem antes da entrega da imagem de escultura e fundição, já se tinha a
egolatria naquela casa, em que cada um agia conforme o seu parecer e a sua
vontade, em total desatenção aos mandamentos do Senhor e de Sua Palavra.
Ah, como há diversas casas em que o Senhor é apenas citado nominalmente,
talvez em orações mecânicas e automáticas (que são verdadeiras rezas), nas
horas de refeição ou pouco antes das horas de dormir, mas onde, há muito,
outros têm sido os verdadeiros deuses da casa! Ah, quantos lares ditos
cristãos em que, na verdade, há muito o Senhor deixou de ser o Rei! Certa
feita, ouvi um testemunho extremamente elucidativo, contado pelo saudoso
pastor Vicente Guedes Duarte, um dos patriarcas das Assembleias de Deus no
Brasil e pioneiro na missão desta denominação no Paraguai. Disse ele que,
certa vez, tendo ido pregar em uma igreja, foi acolhido por uma família,
onde se hospedou. Ao ali chegar, pôde ver, com grande destaque, na parede
da sala, um quadro em que estava escrito: "Esta casa pertence ao
Senhor".
Após o jantar, o saudoso ministro do Evangelho se recolheu para um merecido
descanso, mas, para sua surpresa, não pôde dormir diante das inúmeras
discussões e agressões verbais entre os membros daquela casa durante toda a
noite, onde não faltaram insultos e até palavras obscenas. Logo ao
amanhecer, o pastor fez sua mala e já foi saindo, quando, então, foi
interpelado pelo chefe da família:
_ Pastor, já está indo embora tão cedo? Não vai nem esperar o café da manhã?
O servo de Deus respondeu-lhe:
_ Não, não posso esperar. Ao aqui chegar, vi na
parede uma bonita inscrição, em que se dizia que esta casa era do Senhor,
mas os irmãos não haviam me dito que a tinham alugado para o diabo. Até
logo! Assim tem sido a triste realidade de muitos lares que se dizem cristã.
Têm afirmado que suas residências são locais de adoração a Deus, mas nelas
não se fazem mais cultos domésticos. Têm afirmado que seus lares são
pedacinhos do céu, mas neles só tem havido iniquidade, porfias e
demonstração de todo tipo de pecado. Têm dito que seus lares são
verdadeiras igrejas, mas têm sido, lamentavelmente, vigorosas sinagogas de
Satanás.
Quantos não têm até se recusado a entrar em algumas residências de pessoas
incrédulas única e exclusivamente porque ali há ídolos, quando, em verdade,
ídolos maiores, que não se podem destruir fisicamente, estão a povoar as
suas próprias casas! Não foi no dia em que o ourives trouxe a encomenda
para a mãe de Mica que aquele lar se tornou idólatra. Foi a partir daí que
a idolatria se fez visível e palpável, mas, bem antes, o pecado e o maligno
já haviam dominado aquela família.
Era uma família desmantelada, totalmente divorciada da Palavra de Deus e do
genuíno culto a Deus. Era uma família totalmente alheia à vontade do
Senhor, uma família visceralmente dominada pelo mal e escravizada pelo
pecado.
Uma família desta natureza é uma chaga, é um mal não só para si e para seus
membros, mas para toda uma sociedade. É sintomática que o escritor do livro
dos Juízes comece a relatar o lamentável estado espiritual do povo naquele
período da história de Israel a partir de uma família, uma família que
causaria, posteriormente, como mostra à sequência do texto, a apostasia de
um levita e de toda uma tribo de Israel, a tribo de Dã. É a partir da
família que o trabalho do inimigo de nossas almas, que é roubar, matar e
destruir, tem tido grande sucesso. A partir da família, ele não só destrói
os seus indivíduos, como penetra seja na igreja local, seja na escola, seja
na sociedade como um todo. Não nos esqueçamos de que as igrejas locais nada
mais são que a reunião das famílias dos seus membros. Entrar na igreja
local através da família é uma grande arma satânica nestes dias, mormente
quando falta autoridade espiritual aos chefes de família. A mãe de Mica
exterioriza toda a sua cegueira espiritual, toda a sua apostasia quando põe
dentro de sua casa uma imagem de escultura e fundição, mera representação,
não do Senhor, como afirmava, mas a representação de sua avareza, de sua
maldade, de seu desamor, de sua falta de autoridade. Como um abismo chama
outro abismo (Sl.42:7),
vemos que logo Mica progride este pecado de sua mãe e surge, como consequência
disto, uma casa de deuses (Jz.17:5). Como
afirma conhecido ditado popular, onde passa um boi, passa uma boiada. Feita
a primeira imagem, logo se encarregou Mica, o desobediente filho, de
construir uma casa de deuses. Agora, não era mais uma a imagem, mas havia
várias imagens e, ainda por cima, fez Mica um éfode, ou seja, uma
vestimenta sacerdotal. Percebamos que a egolatria continuava solta naquela
casa. Apesar de todo o pecado, diante até da própria cultura religiosa
israelita, era preciso, de qualquer modo, saciar aquele sentimento de
ausência de Deus que existe em cada ser humano. Conhecedores da Palavra de
Deus e da própria necessidade de servir e adorar a Deus, a família de Mica,
ainda que desmantelada e apóstata, tinha de, alguma forma, fazer com que a
religião estivesse presente naquela casa. Lógico, da forma e do modo
queridos por eles. Era preciso saciar o "eu", o ego, que sentia
falta de Deus, mas queria que Deus Se adaptasse a esses anseios e vontades
advindos da autossuficiência. O adversário de nossas almas, sabedor da
necessidade que o homem tem de encontrar Deus, busca, de todas as formas,
impedir que haja o correto preenchimento desta necessidade e, portanto,
tenta fazer com que o homem supra esta necessidade segundo os ditames da
vontade do indivíduo. Assim, já que há um vazio que somente é preenchido
por Deus, que este preenchimento se faça segundo ditames e regras
estabelecidos pelo homem, por sua vontade. Entretanto, Deus não age assim,
pois é Ele o Soberano e o Senhor de toda a terra. Tem interesse, por Seu
grande amor, e salvar o homem e com Ele viver para todo o sempre, mas isto
deve ser feito conforme a Sua vontade. Jesus diz que quem se sentir cansado
e oprimido deve ir até Ele que Ele o aliviará (Mt.11:28), ou seja, o alívio será dado por Deus e
somente por Ele, segundo as Suas próprias condições.
Querendo ter alívio segundo os seus parâmetros, querendo ter paz, bênção,
prosperidade e comunhão com Deus, mas segundo seu pensamento, Mica e sua
família constroem uma casa de deuses. Agora havia um compartimento especial
da causa dedicado ao culto das mais diversas divindades e até uma
vestimenta sacerdotal. É sempre assim: o engano, a mentira, a farsa tenta
se parecer o mais possível com a verdade. O culto apóstata estabelecido na
casa de Mica tinha até a aparência de um culto a Deus, mas não o era. Não
nos esqueçamos de que tudo aquilo que ali estava sendo criado tinha como
justificativa uma "dedicação integral" ao Senhor. Hoje em dia,
muitos falsos cristos, muitos falsos mestres, muitos falsos profetas têm se
levantado no mundo e atraído a muitos. Na aparência, assemelham-se
muitíssimo aos verdadeiros e genuínos ministros do Evangelho. Suas prédicas
e ensinamentos, sutis como as serpentes, muito se parecem com o verdadeiro
e genuíno anúncio do evangelho. Entretanto, são falsificações! Tenhamos
cuidado e não deixemos que a mentira nos engane que os prodígios e as
aparências tenham o condão de nos levar à falsidade e à perdição. Como se
não bastasse à idolatria desenfreada daquela família, a maldição chegava à
terceira geração. Mica, diz o texto, consagrou um de seus filhos como
sacerdote. Era a inclusão de mais uma geração na apostasia e no desvio
espiritual. Deve-se, aqui, por oportuno, verificar que não se estava diante
de qualquer "maldição hereditária", como alguns destes
falsificadores da Palavra de Deus têm propalado nos últimos tempos. A
salvação de Deus é individual e decorre do exercício do livre-arbítrio de
cada um, não respondendo os pais pelos pecados dos filhos nem os filhos
pelos pecados dos pais (Cf. Ez.18:18-20). Entretanto,
o que se observa aqui é que, quando os pais não cumprem com o seu dever de
ensinar a Palavra de Deus aos seus filhos, transformam-se em poderosos
agentes do adversário de nossas almas, ensinando o errado aos seus filhos
que, por esta influência, acabam sendo, igualmente, induzidos ao erro. O
ambiente daquela família desmantelada era francamente favorável ao pecado e
ao erro e, diante deste ensinamento pecaminoso, tanto Mica quanto seu filho
acabaram sofrendo um perverso processo de má formação moral e espiritual e,
por causa deste processo, sem se falar na própria natureza pecaminosa de
todo ser humano, acabaram se tornando idólatras inveterados. Era o
resultado da péssima educação recebida. Depois da vestimenta, o sacerdote.
Vemos como havia um interesse precípuo de fazer com que o culto apóstata se
assemelhasse a um genuíno culto a Deus! Que esforço inútil! Que desperdício
de tempo! Entretanto, o mal continuava a se irradiar através daquela
família, já um poderoso instrumento de disseminação do pecado e da iniquidade.
Chegaria, mesmo, a provocar a queda de um genuíno e escolhido homem de
Deus. Como já dissemos, a família é o alvo predileto do inimigo de nossas
almas, porque, através dela, o adversário atinge, a um só tempo, tanto os
indivíduos que a compõem como a sociedade como um todo, pois, como se
costuma dizer, é a família a “célula mater.” do corpo social, a base da
sociedade, para, aqui, nos utilizarmos de expressão adotada pela
Constituição brasileira. A partir do momento que a família se deixa
envolver pelos laços do adversário de nossas almas, passa a ser um vigoroso
instrumento para o trabalho do diabo, que outro não é senão roubar, matar e
destruir (Jo.10:10). A
família de Mica já havia cedido aos encantos do adversário e se tornara um
centro de idolatria e, agora, seria um instrumento poderoso para a queda de
um levita. Narra-nos o texto sagrado que, certa feita, um mancebo de Belém
de Judá, da tribo de Judá, que era levita, peregrinava pela montanha de
Efraim e, o que é importante para o nosso estudo em questão, diz-nos o
texto que sua peregrinação tinha a ver com a busca de comodidade, ou, como
nos diz a NVI, um lugar para morar. Vemos, logo de início, que este jovem
também era uma vítima de uma má estrutura familiar. O texto nos diz que se
tratava de um levita de Belém de Judá. Ora, em primeiro lugar, podemos
observar que o jovem habitava numa cidade que não era destinada aos
levitas. Como podemos verificar em Nm.21:13-16, Belém não era uma das
cidades da tribo de Judá que haviam sido entregues aos levitas. Percebemos,
portanto, que o jovem fazia parte de uma família que estava fora do lugar
determinado para eles.
Levando-se em conta que os levitas tinham atribuições específicas
relacionadas com o culto ao Senhor (Cf.Dt.10:8,9), atribuições estas estabelecidas pelo próprio
Deus, que havia escolhido a tribo de Levi em lugar dos primogênitos de
Israel que lhe pertenciam desde o momento em que foram poupados na primeira
páscoa (Nm.8:14-18), vemos que o jovem era proveniente de uma
família que estava desobedecendo à Palavra do Senhor, que não fazia aquilo
que o Senhor lhe havia ordenado, que era “fazerem o serviço da tenda da
congregação” (Nm.8:15). Os
pais do jovem levita, com certeza, havia trocado a vida em alguma das
cidades destinadas aos levitas, onde cuidavam de atividades relacionadas ao
serviço da tenda da congregação, para algum serviço secular, muito
provavelmente mais rendoso e que trouxesse um maior conforto e condição
para a família, esquecendo-se, entretanto, que haviam sido separados por
Deus para uma tarefa muito mais importante e relevante. É muito triste
quando uma família santa, ou seja, que é separada por Deus do meio deste
mundo tão tenebroso, resolve sair do lugar que lhe foi destinado e
estabelecido pelo Senhor e passa a ter outras prioridades que não à de
atender à vontade de Deus. Ela, simplesmente, se desmantela, se desfaz, não
alcançando nem a tão sonhada prosperidade material, nem, muito menos, o que
é muito mais importante, o agrado do Senhor. Vemos que este jovem, ainda
moço, saiu de sua casa, sem destino, sem rumo, certamente porque os sonhos
e os projetos de seus pais haviam falhado. Em busca de uma melhor condição
material, econômico-financeira, a família saíra dos planos divinos e,
agora, assim que pôde caminhar com suas próprias pernas, o jovem abandona
seus pais e tenta aventurar-se pela Palestina, certamente porque haviam
fracassado os intentos e os desígnios estabelecidos pelos seus pais. Nós,
como servos de Deus, como pessoas por Ele separadas para atender ao Seu
chamado (e todos os cristãos são chamados a serem luzes do mundo e sal da
terra, indistintamente, exerçam, ou não, funções de governo na igreja),
jamais nutramos a falsa ilusão de que podemos escolher, ao nosso talante, o
que, onde e como devemos servir a Deus. É imperioso que nos limitemos a
obedecer ao Senhor, permanecendo no lugar que Ele nos determinou, que Ele
estabeleceu, se é que queremos ter uma vida familiar exitosa e abençoada. Belém
de Judá, que viria a ser o próprio local de nascimento do nosso Senhor e
Salvador séculos depois, não era o lugar em que os levitas deveriam estar
e, por isso mesmo, o jovem não viu sequer uma esperança, sequer uma possibilidade
de continuar ali. Neste aspecto, aliás, o jovem tinha mais visão que seus
pais, lembrando-nos até uma canção da música popular brasileira, onde o
compositor afirma que os mais velhos não querem, muitas vezes, enxergar o
novo que está vindo com a evolução dos acontecimentos. O jovem levita
entendeu que Belém de Judá não era o lugar de um levita e de lá saiu,
agindo, neste ponto, sabiamente, como alguém que se apresentava como um
homem separado por Deus para a Sua obra que estava disposto a tudo recomeçar.
No entanto, por falha decorrente da sua própria formação deficiente e
errônea, ao sair de Belém de Judá, o jovem estava animado por um sentimento
que não deve ser o sentimento nutrido por alguém que é separado do mundo e
escolhido de Deus. Diz-nos o texto sagrado que o jovem passou a peregrinar,
a buscar um lugar onde tivesse comodidade, ou seja, onde pudesse satisfazer
as suas necessidades materiais, onde tivesse conforto e riquezas. Embora
tivesse percebido que Belém de Judá não era um local apropriado e adequado
para ficar, o jovem, certamente influenciado pela educação recebida de seus
pais, não pôde perceber que o mal de se estar em Belém de Judá não era a
falta de recursos materiais, a dificuldade de emprego, o problema do
sustento, mas, sobretudo, a inobservância da Palavra de Deus, o
descumprimento dos mandamentos divinos, o desatendimento à vontade do
Senhor. O jovem estava animado pelo mesmo propósito que fizera com que seus
pais desobedecessem a Deus e deixassem uma cidade de levitas para tentar a
sorte onde os levitas não haviam sido chamados. Assim como seus pais,
passou a procurar um local onde pudesse garantir a sua sobrevivência,
reduzindo a esta vida terrena, a posse de riquezas e recursos materiais a
própria razão de ser da sua existência. Muitos têm agido desta forma nos
nossos dias, dias de materialismo, de consumismo e de total menosprezo aos
valores espirituais, dias onde o ter prevalece sobre o ser. Há muitos que,
a exemplo deste jovem levita, passam a peregrinar nesta terra buscando tão
somente alguém ou algo que lhes permita viver regaladamente, que lhes
permita ter uma vida de opulência material e de benesses. Quantos não têm
buscado Jesus única e exclusivamente porque querem ter prosperidade
material, porque querem deixar uma vida de falências, miséria e
dificuldades econômico-financeiras, para serem empresários bem-sucedidos,
magnatas e pessoas ricas? A chamada “teologia da prosperidade” tem em
vista, precisamente, este intento prevalecente na nossa sociedade, intento
que não diferencia o seguidor desta prosperidade de qualquer outro
indivíduo imerso no pecado e no mundo sem Deus. Afinal de contas, quem pode
me dizer qual é a diferença entre alguém que passa a ser crente para
enriquecer e outrem, que é um narcotraficante? Alguém poderá dizer: Não tem
comparação, isto é um absurdo! Alguém que passa a servir a Jesus com
intenção de enriquecer não desgraça a vida de ninguém, não causa mal a
pessoa alguma, apenas aprende a exercer a sua fé e alcança as bênçãos já
prometidas por Deus, enquanto que o narcotraficante enriquece a custa de
vidas humanas, da destruição de famílias, de comunidades inteiras. No
entanto, se bem observarmos ambos os comportamentos, veremos, claramente,
que o que anima tanto um quanto o outro é o amor do dinheiro que, como
Paulo disse bem claramente a Timóteo, é a raiz de toda a espécie de males (I Tm.6:10). E quem garante que o “crente em busca da
prosperidade” não destrói famílias, vidas e comunidades com seus gestos? Porventura,
os escândalos que têm acompanhado esta pregação de prosperidade, as consequências
que têm sido geradas pela conduta decorrente desta pregação não têm gerado
angústias, decepções e descrédito para muitos e, o que é mais grave,
sentimentos e emoções que têm gerado obstáculos praticamente
intransponíveis à conversão de almas que, por causa disto, vão estar
eternamente separadas do Senhor na eternidade? A intenção materialista do
jovem redundou na sua transformação em um sacerdote idólatra e isto continua
ocorrendo até os nossos dias, pois as Escrituras dizem, claramente, que a
avareza nada mais é do que idolatria (Cl.3:5). Devemos servir a Deus com a intenção de agradá-lo,
de fazer a Sua vontade. Assim nos ensinou o Senhor quando nos deu a lição
da oração: “Seja feita a Tua vontade assim na terra como no céu”. Devemos,
sempre, fazer aquilo que agrada a Deus, que seja a Sua vontade. Nosso
objetivo nesta vida deve ser sempre o de estar no centro da vontade do Senhor.
Nunca devemos fazer como o jovem levita, que vivia atrás da comodidade,
atrás do regalo, das vantagens materiais, do bom salário, das benesses, do
“bem-bom”. Quais têm sido as nossas prioridades? Como temos vivido sobre a
face desta terra? Este assunto da comodidade é vasto e comportaria um
estudo específico, razão pela qual nele não nos deteremos, mas fica aqui o
convite para que reflitamos se não estamos, em nossa peregrinação nesta
terra, agindo com os mesmos propósitos daquele mancebo levita. O certo,
para o tema que estamos desenvolvendo, é verificar que o jovem estava
animado por um intento reprovável, mas que havia sido incutido em sua mente
e coração pelos seus próprios pais. Se o jovem não viesse de uma família de
levitas que havia desobedecido a Deus e ido morar numa cidade que não havia
sido reservada para a tribo de Levi, como era Belém de Judá, se o jovem não
tivesse nascido num lar onde o mais importante é a própria satisfação e não
a obediência à lei do Senhor, certamente que não teria elegido a comodidade
como valor a ser buscado, a qualquer preço, a qualquer custo, na sua vida. Os
pais têm de estar conscientes de que serão eles os indutores de
comportamentos, de condutas em seus filhos. A Bíblia, ao falar sobre a
influência dos pais sobre os filhos, usa de uma expressão que, já no meio
do povo de Israel era um provérbio de amplo conhecimento popular. Em Ez.16:44, afirma que “qual a mãe, tal é a sua filha”.
Sem dúvida alguma, a influência que os pais exercem sobre os filhos é
imensa e predetermina boa parte da conduta dos filhos no futuro, a ponto de
o sábio Salomão ter dito que, se instruirmos nossos filhos no caminho do
Senhor, ainda quando velhos eles jamais se esquecerão dos ensinamentos que
receberem. O fato é que, como diz o vulgo, “quem procura, acha”. O mancebo
tanto buscou comodidade que, num belo dia, chegou à casa de Mica, à casa
dos deuses e ali parou. Ao chegar à casa de Mica, o jovem, já deturpado em
seus intentos pela má educação recebida, passa a receber influência da
igualmente péssima educação que havia na casa daquele homem, como já vimos
neste estudo. O jovem, diz-nos o texto sagrado, seguia o “seu” caminho (Jz.17:8), ou seja, mais uma vez notamos, aqui, a
influência deletéria da educação de seus pais que, num gesto de
inobservância da Palavra de Deus, haviam deixado de seguir o caminho do
Senhor, deixado de morar no lugar designado por Deus e resolvido, por sua
própria conta e risco, morarem em Belém de Judá, fazendo o “seu” caminho. O
jovem também havia aprendido assim e estava ele, nas montanhas de Efraim,
buscando o “seu” próprio caminho, tomando conta da “sua” vida, sendo dono
do “seu” próprio nariz. Vivemos um tempo em que se propala aos quatro
ventos a mensagem de que os jovens devem buscar os “seus” próprios
caminhos, que não podem, de forma alguma, seguir os conselhos,
recomendações e orientações de seus pais, tachados pela mídia e por esta
linha de pensamento como “atrasados”, “quadrados”, “caretas”,
“retrógrados”, bem como responsáveis por todas as mazelas, maldades e injustiças
que existem sobre a face da terra. Até mesmo dentro das igrejas locais,
este pensamento, que tem origem no próprio adversário de nossas almas, que
foi aquele que primeiro convenceu o homem a tentar se desprender de Deus,
lá no jardim do Éden, trazendo a mensagem da autossuficiência e da
independência em relação a Deus, a mais antiga mentira que é contada pela
antiga serpente à humanidade. Esta era a situação deste jovem que, mal
formado, mal educado, passa a buscar algo que não é o que Deus requer de nós,
muito menos para aqueles que Ele escolhera para o Seu serviço, como era o
caso do levita, que, agora, fazendo o “seu” caminho, chegava ao último
lugar onde deveria estar um servo de Deus: numa casa de ídolos. Ao chegar à
casa de Mica, o jovem recebeu uma oferta daquele idólatra, a fim de que se
fizesse pai e sacerdote da sua casa, mediante um salário anual de dez
moedas de prata (a versão NVI traduz esta medida por cento e vinte gramas
de prata por ano), além de suporte de todas as despesas com vestuário e
alimentação. Ora, era tudo o que o jovem queria: comodidade! Um bom
salário, roupa e cama lavada e comida à vontade! Quem recusaria uma oferta
destas nos nossos dias? Certamente que muitos jovens, mormente num ambiente
de desemprego como o que vivemos e que só tende a se intensificar conforme
as tendências observadas na economia mundial, não hesitariam em fazer o que
fez aquele jovem, que, prontamente, aceitou a oferta e passou a ser “pai e
sacerdote” da casa de Mica. Este é o principal problema de termos intenções
desvirtuadas e não condizentes com o que nos ensina a Palavra de Deus. O
jovem era movido, em sua peregrinação, pela comodidade, pelo bem-estar
material e disto tinha pleno conhecimento o adversário de nossas almas que,
embora não seja onisciente, tem a seu serviço, como bem retratou um
escritor evangélico, o “mais eficiente serviço de espionagem” do mundo. Com
efeito, se os mais poderosos governos do mundo têm acesso a uma gama enorme
de informações, praticamente sabendo tudo o que se passa no mundo (basta
ver que, no episódio dos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001,
nos Estados Unidos, as investigações apontam que não houve falta de
informações por parte das agências de inteligência norte-americanas, mas,
pelo contrário, falhas na apreciação das informações obtidas), por que o
diabo, que têm a seu serviço milhares e milhares de anjos caídos, não teria
condições de saber quase tudo o que se passa na humanidade? Como dizíamos,
sabendo das intenções do jovem, não foi difícil ao adversário dar o laço
final na vida do incauto, mediante a oferta para que se tornasse “pai e
sacerdote” da casa de Mica. Observemos que todo levita alimentava o sonho
de ser sacerdote, porquanto, embora pertencesse à tribo de Levi e cuidasse
de todo o serviço da tenda da congregação, se o levita não fosse da família
de Arão, de forma alguma poderia ministrar, poderia ser separado para o
sacerdote. Assim, todo levita ficava muito próximo ao sacerdócio, mas dele
não poderia tomar parte. Esta frustração, aliás, foi o móvel da mais dura
rebelião enfrentada por Moisés no deserto, a rebelião de Coré, que
encontrou guarida, precisamente, nesta frustração da tribo de Levi, bem
como da frustração da tribo de Rúben, que, afinal de contas, era o filho
primogênito de Jacó, mas que havia sido alijado das benesses da
primogenitura. O jovem foi convidado para ser aquilo que todo e qualquer
levita almejava ser, mas que Deus não havia determinado que fosse. Um dos
grandes ensinamentos que devemos dar em nossas famílias diz respeito,
precisamente, aos limites que temos como seres humanos.
É indispensável que ensinemos aos nossos filhos que não somos os donos do
mundo nem que a nossa vontade prevalece em todas as situações da nossa
vida. Muito pelo contrário, devemos, em primeiro lugar, fazer à vontade de
Deus, esta, sim, a única vontade soberana, a única vontade que sempre
prevalecerá e, depois de estarmos no centro da vontade de Deus, sabermos
que temos a liberdade para agir naquelas coisas e que Deus aprova ou deixa
à nossa escolha. A Bíblia registra-nos o triste caso que envolveu Adonias,
o filho de Davi, que se tornara o seu primogênito após a morte de Amnom. O
príncipe israelita, diz-nos as Escrituras Sagradas, nunca soube o que era
um “não” de seu pai (I Rs.1:6).
Adonias viveu sem qualquer limite, sem qualquer orientação, achando que sua
vontade deveria sempre prevalecer, o que era um desastre para alguém que,
pelas regras normais de sucessão, deveria suceder ao pai no trono de
Israel. O resultado disto foi que, num belo dia, resolveu Adonias tomar
conta do trono, ainda antes da morte de seu pai, que já se encontrava
enfermo e próximo à morte. Sem limites, sem respeito e consideração para
com seu pai, acabou, por causa disto, não só perdendo o trono como também a
sua própria vida, pois, assim que Salomão assumiu o trono, uma vez mais
manifestou a sua impertinência e ousadia irresponsável, o que lhe custou à
própria morte. Temos ensinado limites aos nossos filhos? Têm eles sido
ensinados que nem tudo é como queremos nesta vida? Têm eles visto em nós
uma submissão à vontade de Deus? Aquele pobre jovem levita não sabia o que
era isto e, ao lhe ser dada uma oferta de algo que, pela vontade divina,
jamais poderia alcançar, qual seja, o sacerdócio, o jovem levita não
hesitou e quis ser aquilo que jamais Deus lhe havia destinado a ser.
Muitos querem ser aquilo que Deus não quer que sejam e, muitas vezes, Deus,
dentro de Sua vontade permissiva, não intervém, não impede que sejam alcançadas
tais funções ou posições. Assim foi, por exemplo, no caso do sacerdócio
instituído por Jeroboão. Ao invés de separar os levitas para a função
sacerdotal, Jeroboão resolveu estabelecer o seu próprio culto, à sua
maneira, fazendo sacerdotes dos mais baixos do povo (I Rs.12:31). Observemos a psicologia usada por Jeroboão:
pegou dos mais incapazes, dos mais incompetentes, dos mais desqualificados
e os tornou sacerdotes. Todos estes aceitaram a incumbência porque,
obviamente, também sabiam que jamais poderiam alcançar, segundo os ditames
da lei divina, esta honraria, mas o que lhes importava não era seguir a
Palavra de Deus, mas, sim, ter comodidade, ter posição, “status” e
desfrutar das benesses da função que passariam a exercer. Lamentavelmente,
muitos Jeroboões têm surgido no meio do povo de Deus, também constituindo
ministros entre os mais baixos, os mais desqualificados, pois seu único
objetivo é dominar, não ter “concorrentes”, “competidores”, pessoas que,
movidas pelo poder e pelas benesses que este poder lhes confere,
esquecem-se do chamado divino, menosprezam o objetivo do Senhor nas suas
vidas. Não nos deixemos levar pela vaidade, pelas ilusões das riquezas, da
posição social, dos benefícios materiais, mas que nosso intento seja o de
agradar a Deus, de buscar primeiramente o Seu reino e a sua justiça,
sabendo que tudo o mais nos será acrescentado! Mas ao jovem não foi
oferecido apenas o sacerdócio, mas também lhe foi ofertada a posição de
“pai” (Jz.17:10). Ora, como temos dito seguidamente neste
estudo, o jovem levita era proveniente de uma família que estava fora da
direção divina, de uma família que, certamente, não oferecia qualquer
vantagem ou comodidade ao jovem, a ponto de ele ter saído do lar e iniciado
uma peregrinação em busca de bem-estar. Não é desarrazoado dizer, portanto,
que o jovem não tinha, a esta altura, uma boa imagem de seu pai e,
certamente, vivia um conflito psicológico típico da juventude e da
adolescência, a chamada “crise dos pais imperfeitos”, resultante da
circunstância de os filhos descobrirem que seus pais não são aqueles seres
humanos perfeitos que eles, ao longo da infância, acreditaram eles ser. Como
afirma Stephen Kanitz, “… a maioria dos jovens sonha em ter pais perfeitos
para sempre, um governo perfeito a cada eleição, em criar um mundo perfeito
sem injustiças, onde até os grandes planos de governo funcionam porque
serão sempre perfeitos. Essa crise traz também uma enorme insegurança
pessoal. A redoma de vidro do pai herói e da mãe heroína se desfaz. Uma
crise dessas mal resolvida pode se agravar e se transformar em desilusão,
desânimo, o que pode levar à exclusão social e à perda de ambição.…” (A
crise dos pais imperfeitos. Veja, ano 37, nº 13, edição 1847, 31 mar.2004,
p.20). Este jovem, assim pensando, decepcionado com a figura paterna, é
convidado por alguém que tinha a idade de ser seu pai, para ser “pai” da
sua casa, ou seja, para exercer uma posição de mando, para ser tudo aquilo
que seu pai não tinha sido para ele. Autoridade, poder, posição, em suma
era o que se oferecia ao jovem levita, em troca, naturalmente, do total
menosprezo à Palavra de Deus, porquanto passaria a ministrar culto a
ídolos, algo abominável aos olhos de Deus. Porém, os valores incutidos na
mente do jovem não tinham qualquer compromisso com Deus e o jovem,
prontamente, aceitou a oferta.
É interessante observar que, embora lhe tenha sido prometido ser “pai” da
casa, o texto bíblico diz-nos que o jovem passou a ser tratado como um dos
filhos de Mica (Jz.17:11), o
que revela, portanto, como era enganosa a oferta feita por Mica. Ademais,
como já vimos neste estudo, o tratamento dado por Mica a seus filhos não
era dos melhores, sendo que, do ponto-de-vista espiritual ou moral, era,
mesmo, um tratamento desastroso. É sempre assim que acontece quando alguém
aceita a oferta do maligno: é enganado e sua condição jamais será a
prometida pelo pai da mentira que, quando mente, faz o que lhe é próprio e
natural (Jo.8:44). O jovem foi consagrado sacerdote por Mica e
ali esteve na sua casa como um ministro ilegítimo de um culto espúrio. A
família de Mica estendia, assim, os seus tentáculos malévolos e, agora, não
atingira apenas a condição espiritual de seus integrantes, mas já trazia
prejuízo espiritual a um levita, a um escolhido de Deus que, por falta de
orientação, educação e vigilância, fora atraído por este verdadeiro cancro
que se instalara no meio do povo de Deus. Percebamos, portanto, que uma
família desmantelada não prejudica apenas os seus membros, mas, como uma
verdadeira célula cancerosa, vai formando um tumor no meio social,
atingindo aqueles que estão à sua volta, bem como aqueles que com ela entram
em contato. Uma família desmantelada é um verdadeiro instrumento destruidor
nas mãos do adversário, um veículo de desvirtuamento e de perdição para
tantos quantos dela se aproximam e por ela se deixam influenciar. Mas os
efeitos funestos da família de Mica não se limitariam a este jovem levita,
agora sacerdote na casa de Mica. Na sequência do texto bíblico, no capítulo
18, veremos que este sacerdote, movido sempre pela ganância das coisas
materiais, tornar-se-ia sacerdote da tribo de Dã, a primeira tribo a
adotar, coletivamente, a idolatria (Jz.18:30,31), algo que talvez até explique porque a tribo
de Dã não é mencionada na relação dos 144.000 judeus que pregarão o
Evangelho na Grande Tribulação (Ap.7:4-8). Como
vemos, portanto, a má educação e a inobservância da Palavra de Deus não se
circunscrevem à família, mas seus efeitos se fazem sentir na sociedade como
um todo. A desintegração familiar hoje promovida pelo adversário de nossas
almas é a causa mais importante para o clima de desordem, de violência, de
criminalidade, de desgoverno que vivemos, atualmente, na face da Terra. As
famílias não conseguem, mais, porque saíram da direção de Deus, incutir
valores e princípios de convivência, solidariedade e harmonia aos seus
filhos e as novas gerações crescem e atingem a idade adulta sem quaisquer
referências, como presas fáceis das ofertas e facilidades apresentadas pelo
deus deste século, cujo objetivo é, tão somente, matar, roubar e destruir. É
um verdadeiro perigo haver uma família desmantelada no meio do povo de
Deus, como era a família de Mica que, do monte de Efraim, não deixou de
promover um grave prejuízo a Israel, trazendo a idolatria e a apostasia
para toda uma tribo, a tribo de Dã, que, aliás, nem sequer era a tribo de
Mica e sua família, sem se falar na ruptura que fez na tribo de Levi,
através daquele jovem que acabou se tornando o primeiro de uma linhagem
sacerdotal espúria e ilegítima que perdurou, diz-nos a Bíblia, até a
destruição do primeiro templo (Jz.18:30) Não
permitamos que nossa família seja uma erva daninha, seja o início de um
tumor canceroso no meio do povo de Deus, mas sigamos o modelo bíblico e,
assim, certamente, seremos ricamente abençoados pelo Senhor.
AMÉM !
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